domingo, 24 de maio de 2009

Catarse

No final das contas, o contrato entre a mente e a Arte se dá por assim dizer através de um acordo. Todas as neuroses, vulnerabilidades, suscetibilidades e obsessões se tornam mais discretas em vida corrida para se tornarem extravagantes em vida decorrida.

Comete-se crimes bárbaros com palavras, pincéis e músicas. Ninguém paga. Não há culpa. Ninguém lamenta. E o que existe se camufla do que não existe para se sentar ao nosso lado em salas cheias. Para transitar entre nós.

Então, o artista prossegue com essa dócil sagacidade. Driblando leis, ética, palavras, sociedade, família. Driblando a si mesmo para fazer existir o que nele há de mais secreto, mais abjeto, mais sublime. Para se satisfazer secretamente.

Entrementes, eu permaneço com esse bisturi cirúrgico nas pontas dos dedos. Permaneço tentando dissecar a Psiquê, o inefável. Traço um corte profundo desde o meu períneo até a medula espinhal para remexer o que posso encontrar no dia de hoje. O que eu vejo.

Trago tudo a tona, enumerando pedaços da anatomia humana.

Para a literatura, tudo é estética. Estilo.

Para mim, emoção emergindo. Sentimento esbarrando contra os órgãos quando lhe arranco. Narrações de viagem. De nascimento.

Acordo silencioso. Irreal e real estabelecendo contratos sussurrados. Disfarçando feiúra com beleza. Certeza com dualidade. Simplicidade com ambigüidade. Para que isso viva. Respire sem me ferir, sem me ferrar. Para que eu me satisfaça.


2 comentários:

Priscila disse...

Essas contradições que fortalecem a gente, que fazem da vida um desafio, e que deleitam os artistas, a quem cabe tentar dar uma forma a tanta abstração, para ajudar a entender tudo isso melhor...

Rafa disse...

Artesão moldando ferro.